Israel lembra 50 anos da Guerra do Yom Kippur

Israel lembra 50 anos da Guerra do Yom Kippur

 

Às 14h do dia 6 de outubro de 1973, sirenes de alarme interromperam o silêncio do dia mais sagrado para o povo judeu, O Yom Kippur, Dia do Perdão, dando o sinal para o início da Guerra do Yom Kippur, conflito com Egito e Síria que, embora tivesse acabado com uma vitória significativa, contabilizou mais de 2.600 soldados foram mortos, centenas de capturados e mais de 7.200 soldados e civis feridos. Em 2023, ao se completar 50 anos da guerra, o momento é propício para a reflexão acerca do que foi aprendido com o conflito e de que forma ela continua relevante nos tempos atuais.

“Aquela guerra tocou os medos mais profundos da existência judaica. Israel foi completamente surpreendido pelo conflito. A falha da inteligência em alertar a intenção do Egito e da Síria de iniciar uma guerra é vista como o maior fracasso na história da comunidade de inteligência em Israel, que desde então influenciou e moldou todas suas análises estratégicas para impedir que uma surpresa como essa voltasse a acontecer. Indicações significativas de alerta mostraram que as forças egípcias e sírias se preparavam para um ataque coordenado contra Israel, mas a avaliação da inteligência descartou qualquer possibilidade de conflito, pegando o país de surpresa”, lembra Revital Poleg, diplomata de carreira e colaboradora do Instituto Brasil-Israel (IBI).

“Na véspera da Guerra do Yom Kippur, Israel estava complacente, com a sensação de sucesso em termos de segurança, com a liderança cativa na concepção de sua capacidade e força militar, de certa maneira construída com o sucesso militar e mesmo em termos internacionais obtidos alguns anos antes, com expressiva vitória na Guerra dos Seis Dias, em 1967. Essa falsa sensação de poderio fez com que o país deixasse de lado as informações de inteligência que alertavam sobre a perspectiva de guerra por parte de seus inimigos. Na verdade, simplesmente não se acreditava que eles fossem capazes de iniciar o conflito. Mas, ele aconteceu e foi muito doloroso”, diz Revital.

A Guerra do Yom Kippur não deixou traumas e marcas apenas sob o aspecto da segurança. Também trouxe marcas para os fatores sociais, econômicos e políticos, entre outros. Grandes protestos eclodiram contra o governo por causa do grave erro da inteligência e o alto custo de vidas humanas. A primeira-ministra, Golda Meir, renunciou e o Chefe do Estado-Maior foi demitido. Em 1977, quatro anos após o conflito, houve a primeira reviravolta política quando o Likud, liderado por Menachem Begin, chegou ao poder após 30 anos de domínio da esquerda.

“Na época, o país perdeu o norte também na condução econômica. Israel registrou uma grande queda no crescimento, a inflação se intensificou, chegando a 500% em 1984, com a dívida nacional de 260% e gastos nacionais de defesa de cerca de 35%, situação que perdurou por uma década e, inclusive foi chamada de a década perdida, até que o país pudesse novamente entrar na rota da recuperação”.

Mudanças militares

Após o grande fracasso que marcou a guerra, Israel aprimorou seu sistema de inteligência, tornando-se uma das referências mundiais. O quadro de reservistas militares também foi alterado. O reexame do conceito de reservas resultou na ampliação do tempo de reserva anual e no crescimento da diversidade de forças convocadas para as reservas, o que, por um lado, acrescentou ao exército áreas de conhecimento e experiência e, por outro, ampliou o escopo total das forças militares disponíveis ao Estado de forma contínua e, principalmente, em momentos de emergência.

Sob esse aspecto, inclusive, Revital lembra que “existe uma grande relevância no contexto atual, o que explica o efeito considerável do protesto dos reservistas contra a revolução jurídica sobre a capacidade militar do país”.

Para além do lado militar, a guerra também ‘sacudiu’ Israel e permitiu o ressurgimento do espírito de empreendedorismo, de iniciativa, da capacidade de improvisação e da criatividade e que, desde então, não pararam mais, em quase todas as áreas.

“É importante lembrar que a resiliência de um país não é garantida de antemão e para sempre. Existe o risco de cair em um conceito errado, ainda que haja bons sistemas operando atualmente. Por isso, vale ressaltar que a Guerra do Yom Kippur, mesmo passados 50 anos, segue nos ensinando a importância da liderança, da visão, de assumir responsabilidades, de tomar decisões com coragem, de liderar desafios de longo prazo e não pensar apenas no dia seguinte, como é o caso do atual governo, infelizmente”, destaca a diplomata e colaboradora do IBI.

Nesse sentido, ela adverte: “quando o líder tenta preservar a situação, em vez de resolvê-la, e é constantemente responsivo e defensivo, conforme é o caso da liderança atual, como se vê há anos na fronteira com Gaza, na Cisjordânia ou nas fronteiras com o Líbano, ele de fato não produz nenhuma iniciativa, nem no aspecto de segurança nem no político. Então, apesar de todas as diferenças em relação ao período de desgaste que precedeu a guerra do Yom Kippur, há muitas similaridades com a situação atual, de modo que, naquela época, a principal preocupação era com a reação e a defesa, e com a preservação da situação, e isso também é o que está acontecendo hoje”.

Por essa razão, ao lembrar da data de 50 anos da Guerra de Yom Kippur, Revital acredita se tratar de lição muito importante uma análise profunda e mudança de comportamento. “Na véspera do conflito, não analisamos a fundo a situação, nem tomamos medidas para transformar a realidade política regional, nem sequer prestamos atenção ao que não correspondia à nossa visão e, no final, acabamos surpreendidos e pagamos um preço extremamente alto. Essa conduta é a semente de um desastre. Ainda com todas as diferenças que ocorreram desde então em todos os aspectos, referindo-se especificamente ao nosso primeiro-ministro, esperamos que toda essa realidade pela qual passa Israel seja cuidadosamente analisada. Nesse sentido, aliás, quanto mais cedo, melhor’, conclui.

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