Grupo de Gestão Compartilhada do Acervo Nosso Sagrado, Unirio e Iphan lançam o projeto para tombar e renomear todas as peças da coleção sagrada apreendidas pela polícia entre 1890 e 1946, no Rio de Janeiro

Grupo de Gestão Compartilhada do Acervo Nosso Sagrado, Unirio e Iphan lançam o projeto para tombar e renomear todas as peças da coleção sagrada apreendidas pela polícia entre 1890 e 1946, no Rio de Janeiro

 

Mãe Meninazinha de Oxum

Maria do Nascimento, a Mãe de Santo, Mãe Meninaziinha de Oxum, do Terreiro Ilê Omolu Oxum foi a responsável pela aula magna no lançamento

A cerimônia de lançamento aconteceu ontem, 31 de março de 2025, às 15 horas,
na sede da Unirio e marca o início de uma nova etapa de reparação
histórica para as comunidades tradicionais de terreiros.

O projeto de pesquisa “Acervo Nosso Sagrado: pesquisa, identificação,
reconhecimento e gestão participativa de acervo religioso afro-brasileiro”
surgiu da parceria entre o Grupo de Gestão Compartilhada do Acervo
Nosso Sagrado, a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
(Unirio) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
O projeto será lançado oficialmente no dia 31 de março de 2025, às 15 horas,
na sede da Unirio, com a presença das lideranças religiosas e dos parceiros
deste projeto. O professor Dr. José da Costa Filho, reitor da Unirio, celebra
este trabalho: “a Unirio está honrada e orgulhosa por fazer parte desta
pesquisa que irá contribuir para a revalidação, o reconhecimento e o
tombamento integral do Acervo Nosso Sagrado, que se apresenta como um
passo fundamental e necessário para a reparação histórica junto aos povos de
terreiros”.

De acordo com o Plano de Trabalho elaborado pela Unirio em 2024, o
objetivo do projeto é desenvolver pesquisa específica sobre o Acervo Nosso
Sagrado, em parte tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (Iphan), em 1938 (processo de tombamento 035-T-38), e que hoje se
encontra no Museu da República. A pesquisa acadêmica, visa à elaboração de
um dossiê técnico que forneça subsídios ao Iphan para instrução do processo
de rerratificação do bem (processo SEI 01500.900458/2017-49), bem como
ações de preservação, pesquisa, documentação, comunicação, divulgação e

valorização, em articulação com o Grupo de Gestão Compartilhada do Acervo
Nosso Sagrado, previstas para serem realizadas até o ano de 2026.
.
O Acervo Nosso Sagrado é constituído de 519 objetos sagrados
(sendo 126 deles tombados pelo Iphan em 1938) e tem imensa relevância
para os religiosos de matrizes africanas. Formado a partir de batidas policiais
em terreiros de Candomblé e Umbanda, do Rio de Janeiro, nas primeiras seis
décadas da República (1890 – 1946), as incursões eram instruídas por ordens
de cunho racista, que criminalizavam essas práticas religiosas, vinculando-as
ao curandeirismo, ao charlatanismo e ao baixo espiritismo e, com base nessas
vinculações, interrompiam cerimônias religiosas, prendiam seus praticantes e
confiscavam seus objetos como “provas do crime”.

Depois de uma intensa campanha das comunidades tradicionais de
terreiros liderada pela iyalorixá do Ilê Omolu Oxum, Mãe Meninazinha de
Oxum, o Nosso Sagrado (ainda sob o nome de “Coleção Museu da Magia
Negra”) foi transferido para o Museu da República, em 21 de setembro de
2020, em caráter de reparação e por solicitação do Grupo de Gestão
Compartilhada. Em março de 2023, finalmente o nome da coleção foi alterado
no livro de tombo do Iphan, a pedido das lideranças religiosas. Na época, o
presidente do Iphan, Leonardo Grass, afirmou que “a retificação do nome no
Livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico se tratava de uma
reparação histórica pois a terminologia era bem preconceituosa e desprovida
de sentido, porque é um termo pejorativo para designar e fazer referências às
matrizes africanas religiosas” – conclui Leonardo Grass. Vale ressaltar que
cada etapa do trabalho realizado pelo Grupo de Gestão Compartilhada, opera
para expandir conhecimentos sobre as práticas religiosas de matrizes
africanas, afirmando o direito à memória, à cultura e à vida, sendo tratados em
sentido contrário ao histórico de manuseios insensíveis que sofreram na
polícia.

De acordo com o coordenador acadêmico do projeto, professor dr.
Mario Chagas, “todas as ações deste projeto operam em torno do Acervo
Nosso Sagrado e na direção de construir uma consciência social antirracista e

democrática. Essas ações envolvem o povo de Axé, bem como, alunos,
professores, pesquisadores e profissionais da área do patrimônio cultural em
geral”. Mãe Meninazinha de Oxum costuma dizer que “o Nosso Sagrado não
devia ser um acervo, mas, se é, que seja um instrumento pedagógico
antirracista”. A constituição desse acervo “é atravessada pelo racismo,
especialmente aquele que se manifesta desqualificando expressões culturais
não brancas, criminalizando objetos das religiosidades afro-brasileiras” –
conclui Mario Chagas.

Considerado como uma nova etapa da reparação histórica o projeto
“Acervo Nosso Sagrado: pesquisa, identificação, reconhecimento e
gestão participativa de acervo religioso afro-brasileiro” vai proporcionar
uma correta leitura sobre cada um dos objetos sagrados, a partir da
perspectiva dos conhecimentos das lideranças religiosas, corrigindo os nomes
que muitas vezes eram designados de maneira racista e preconceituosa pelos
agentes policiais, quando foram apreendidos. Este novo inventário ficará
disponível com acesso universal em uma plataforma digital oficial do Ministério
da Cultura.

 

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