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O que o governo Jair Bolsonaro esconde com o sigilo de 100 anos? Sem foro privilegiado ele será julgado como pessoa comum

O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, já deixou claro que pretende derrubar com rapidez os sigilos de cem anos que o governo de Jair Bolsonaro adotou sobre uma série de informações, como o cartão de vacinação do presidente ou as vezes que seus filhos estiveram no Palácio do Planalto.

“Eu vou ganhar as eleições, e quando chegar dia primeiro de janeiro, eu vou pegar seu sigilo e vou botar o povo brasileiro para saber por que você esconde tanta coisa. Afinal de contas, se é bom, não precisa esconder”, prometeu o petista, no debate do segundo turno da TV Bandeirantes.

Mas, o que Bolsonaro tenta esconder?

Além do fim desses sigilos, outras decisões do próximo governo também poderão afetar a família Bolsonaro, como a troca de comando da Polícia Federal e a escolha do novo Procurador-Geral da República em setembro do próximo ano. O presidente enfrenta acusações de ter interferido nessas instituições para evitar investigações contra si e seus filhos.

Sigilo de cem anos

A imposição de sigilo de um século ocorreu em situações que ganharam destaque durante o governo Bolsonaro, como nesses quatro casos:

  • O cartão de vacinação de Bolsonaro foi colocado em sigilo, em meio à pandemia de Covid-19 e no contexto de que o presidente questionava eficácia e segurança dos imunizantes;
  • O governo determinou sigilo de cem anos sobre informações dos crachás de acesso ao Palácio do Planalto emitidos em nome dos filhos Carlos Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro;
  • A Receita Federal impôs sigilo de cem anos no processo que descreve a ação do órgão para tentar confirmar uma tese da defesa do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, sobre a origem do caso das “rachadinhas”;
  • O Exército impôs sigilo de cem anos no processo que apurou a ida do general da ativa e ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello a um ato no Rio de Janeiro com o presidente e apoiadores do governo.

A Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) é um órgão colegiado composto por nove ministérios: Casa Civil, Justiça e Segurança Pública, Relações Exteriores, Defesa, Economia, Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, Advocacia-Geral da União e Controladoria-Geral da União.

Inquéritos judiciais contra Bolsonaro

Bolsonaro enfrenta acusações de interferir na Polícia Federal, órgão que tem inquéritos abertos contra o presidente e seus filhos. Uma dessas investigações apura acusações de interferência levantadas pelo ex-ministro Sergio Moro em 2020, quando pediu demissão do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Assim que assumir o cargo, em primeiro de janeiro de 2023, o petista poderá nomear um novo diretor-geral para a Polícia Federal. O novo chefe da instituição, por sua vez, deve escolher novos nomes para postos chaves, como as superintendências regionais.

As decisões de manter o tema em sigilo são feitas em resposta a pedidos apresentados por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), geralmente sob alegação de que documentos continham informações pessoais.

Também há caso em que o governo tentou manter a informação secreta e depois mudou de ideia — como os dados sobre visitas ao Palácio do Planalto de pastores suspeitos de favorecer a liberação de verbas do Ministério da Educação para prefeitos aliados.

O sigilo de no máximo cem anos, decretado em resposta a pedidos de informação do governo, está previsto na lei que acabou com o sigilo eterno de documentos oficiais — a Lei de Acesso à Informação. Ela foi sancionada em 2011 pela então presidente Dilma Rousseff — e foi assinada junto com a lei que criou a Comissão da Verdade.

No artigo 31, a lei prevê que informações pessoais relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem tenham acesso restrito pelo prazo de até cem anos.

Também está lá um trecho que busca conter o uso dessa medida: o texto diz que a restrição de acesso de “informação relativa à vida privada, honra e imagem de pessoa não poderá ser invocada com o intuito de prejudicar processo de apuração de irregularidades em que o titular das informações estiver envolvido, bem como em ações voltadas para a recuperação de fatos históricos de maior relevância”.

Inquéritos já autorizados pelo Superior Tribunal Federal

Atualmente, há quatro inquéritos autorizados pelo STF em que o presidente é investigado pela Polícia Federal por suspeitas de diferentes crimes:

  • Sobre divulgação de notícias falsas sobre a vacina contra covid-19 (INQ 4888);
  • Sobre vazamento de dados sigilosos sobre ataque ao TSE (INQ 4878);
  • Inquérito das fake news, sobre ataques e notícias falsas contra ministros do STF (INQ 4781);
  • Sobre interferência na Polícia Federal (INQ 4831).

Bolsonaro sem foro

Bolsonaro também enfrenta as acusações de crimes feitas pela CPI da Covid, que estão em apuração pela Procuradoria Geral da República (PGR).

No entanto, a partir do momento em que deixar a Presidência da República, Bolsonaro perde o foro privilegiado e passa a responder por suspeitas na Justiça Comum.

A Polícia Federal poderá continuar as investigações sem autorização do Supremo. As apurações que estão sendo feitas pela Procuradoria Geral da República passarão para a competência de instâncias inferiores do Ministério Público. Os processos no TSE passam para o TRE da região onde houve a suspeita.

Se o Ministério Público decidir fazer uma denúncia contra Bolsonaro, ele será julgado por um juiz de primeira instância.

Uma exceção a essa regra, porém, pode ocorrer no caso do inquérito das fake news, já que nesse caso pessoas sem foro privilegiado estão sendo investigadas no STF, suspeitas de ataques contra a própria Corte e o Estado Democrático de Direito.

Enquanto Bolsonaro perderá o foro privilegiado, seus filhos Eduardo Bolsonaro (deputado federal) e Flávio Bolsonaro (senador) continuam tendo foro especial no STF em casos de supostos crimes relacionados ao seus mandatos. Eduardo Bolsonaro é alvo também do inquérito das fake news.

Dessa forma, ambos podem ser afetados por uma provável

POR: Rita Moraes
Publicado em 03/11/2022