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Ministério Público do Trabalho notifica a Globo por racismo em programação

A Rede Globo de Televisão foi notificada na sexta-feira, 11,  pelo Ministério Público do Trabalho, que  recomendou à emissora 14 medidas para promover a participação de pessoas negras em produções audiovisuais e no jornalismo. A ação foi motivada pela ausência de personagens pretos e pardos* na novela Segundo Sol, ambientada em Salvador,  Bahia, e que estreia na segunda-feira, 14. 

 A recomendação prevê um conjunto de ações para promover a igualdade racial “em todo ambiente de trabalho da empresa”. Entre elas, a mais importante é a elaboração de um plano de ação prevendo formas de incluir, remunerar e garantir a igualdade de oportunidades aos negros. Foi recomendado também a realização de um levantamento de negros e negras em todas as produções da emissora, incluindo o jornalismo.
 
“Estamos diante de uma situação que é vista como discriminatória”, com base em leis internacionais e no Estatuto da Igualdade Racial. A TV Globo tem 10 dias para comprovar as mudanças no roteiro e na produção da novela Segundo Sol e 45 dias para apresentar um cronograma de cumprimento das demais recomendações. Caso não sejam atendidas, o MPT pode propor ação judicial como último recurso.
 
“Decidimos expedir essa nota com o fim de mostrar a importância de a empresa respeitar a diversidade racial”, declarou a coordenadora Nacional de Combate à Discriminação no Trabalho do MPT, procuradora Valdirene Silva. Ela disse que, apesar de a novela ser uma obra artística e aberta, “tem a obrigação de incluir atores negros em proporção suficiente para uma real representação da sociedade”.
 
 
A TV Globo não confirmou ter sido notificada da recomendação. Porém, em nota, reconhece que a novela tem uma representatividade menor do que gostaria e disse que busca ampliá-la. “Vamos trabalhar para evoluir com essa questão”, informou. A notificação do MPT é assinada pelos seis procuradores do grupo de trabalho de combate à discriminação e amparada no Estatuto da Igualdade. A lei federal recomenda ao poder público a promoção de igualdade racial no mercado de trabalho público e privado.
 
Críticas
As críticas à TV Globo se intensificaram após a divulgação de “teasers” da nova novela, onde aparecem raros artistas negros,  apesar de o enredo se passar na Bahia, estado com uma das maiores populações negras no país, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Uma campanha foi lançada com cartazes de artistas negros que já passaram pela emissora, mas ignorados pela produção.
 

A União de Negros pela Igualdade (Unegro), que lançou a campanha com cartazes de atores negros, também se pronunciou sobre a produção global. Em nota, afirmou que a mídia é “pouco permeável à ideia de ter o negro como protagonista”, reflexo de uma cultura que nega as identidades negras e reforça a exclusão desde a escravidão no Brasil.

 A nota citou papéis negativos geralmente dados a artistas negros, como “o escravo, a mulata lasciva, a empregada doméstica, o preto bobo ou ignorante que faz a gente rir e o bandido”, destacando também os “positivos”, tais como “o jogador de futebol, o sambista ou aquele personagem que interpreta a exceção: o moço de família humilde que lutou muito e venceu na vida. Figuras que não são exclusividade da ficção, vistos também em programas de auditório e no jornalismo”.
 
Com a inserção de personagens em destaque em novelas e propagandas, a Unegro defende que a sociedade encare o problema. “A inserção não resolverá as questões raciais. O que se espera disso é uma contribuição para o debate [do racismo no país]”.
 
A dramaturga negra Maria Shu, autora de uma das primeiras mensagens alertando para o privilégio de atores brancos em o Segundo Sol, fez constatação semelhante. “A presença dos negros na TV tem apenas um foco, que é a espetacularização de suas dores. Estudamos, alcançamos novos espaços, mas não nos reconhecem como sujeitos produtores de conhecimento”.
 

 

POR: Rita Moraes
Publicado em 14/05/2018