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Cinema Brasileiro de luto: morre o cineasta Nelson Pereira dos Santos

O cinema brasileiro ficou orfão de um dos seus grandes nomes. Morreu no sábado, 21,  no Rio, aos 89 anos,  Nelson Pereira dos Santos. Ele deu entrada no Hospital Samaritano, na Zona Sul do Rio, no meio da semana passada, com pneumonia, mas foi diagnosticado com câncer no fígado. O câncer muito agressivo, que já estava num estágio avançado. A família confirmou a morte do cineasta, às 17h. O corpo de Nelson Pereira dos Santos está sendo  na sede Academia Brasileira de Letras, no Centro do Rio, e será enterrado no Cemitério São João Batista.

Tudo começou na década de 50, quando o jovem paulista, diplomado em cinema na França, veio ao Rio de Janeiro mostrar em preto e branco a pobreza dos morros cariocas. O filme Rio 40 graus conta a história de cinco meninos pobres que correm a cidade vendendo amendoim. Foi um marco do cinema novo, mas o chefe da segurança pública da época viu e não gostou. Censurou o filme dizendo, entre outras coisas, que ele tinha uma mentira térmica: nunca fez 40º no Rio. Mas não havia censura capaz de impedi-lo de cumprir o seu destino.

Nelson Pereira do Santos foi um predestinado. Ainda pequeno de colo, era levado pelos pais todo domingo para ver filmes no cinema. A mãe carregava mamadeira para as sessões. O menino cresceu lendo a nossa literatura: Jorge Amado, Guimarães Rosa, Machado de Assis, Graciliano Ramos. Aquelas histórias formaram imagens que Nelson nunca mais esqueceu. E assim que pôde correu atrás de cada uma delas. De Amado, a Tenda dos Milagres. De Graciliano, Vidas Secas.

Na década de 70, rodou uma mistura de aventura e comédia. “Como era gostoso o meu Francês” levou 800 mil espectadores às salas de cinema. Em 1984, mais um flerte literário, Nelson Pereira dos Santos volta a rodar um filme inspirado em Graciliano Ramos: Memórias do Cárcere.

“Eu acho que o Graciliano, para mim, não somente para mim, mas para todos os brasileiros da minha geração, é um grande pai cultural. É um homem que deixou na sua obra um caminho que deve ser percorrido. Essa relação com a realidade social e humana que existe no Brasil”, disse o cineasta na época.

Em 2006, Nelson Pereira dos Santos foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. O primeiro cineasta entre os imortais. Ocupou a cadeira que tem como patrono Castro Alves.

Ele tinha, além do cinema outra paixão: a música. A música brasileira. Um dos seus últimos filmes lançado em 2011, “a música segundo Tom Jobim” concretizou no cineasta o amor pela música.

Nelson foi um dos principais expoentes do Cinema Novo, considerado na verdade, o precursor do movimento e responsável por alguns dos filmes mais importantes da sétima arte nacional. Além do já citado na matéria,  Rio, 40 Graus, dirigiu Vidas SecasMemórias do Cárcere e Rio, Zona Norte. Além do documentário A Música Segundo Tom Jobim, Nelson lançou a A Luz do Tom, ambos lançados em 2012.

Foi vencedor do Prêmio FIPRESCI por Memórias do Cárcere e também do Prêmio OCIC, porVidas Secas, ambos concedidos após participações no Festival de Cannes, Nelson marcou presença também no Festival de Berlim, onde competiu por quatro vezes ao Urso de Ouro, com Fome de Amor, Como Era Gostoso o Meu FrancêsTenda dos Milagres e A Terceira Margem do Rio. Ainda em Cannes, ele concorreu à Palma de Ouro por Vidas SecasAzyllo Muito Louco e O Amuleto de Ogum.

A morte repercutiu na imprensa, entre cineastas e atores.

Ney Sant’Anna, filho

“Ele tinha essa visão de amor ao Brasil, um homem que amava essa terra como poucos, me ensinou isso. E amor ao povo brasileiro, que é um povo trabalhador, esforçado, que luta todo dia. Isso que está nos filmes dele, esse amor que ele tem por esse país e por nossa gente”.

Mila Chaseliov, neta

“Eu espero viver metade da vida que ele viveu. Meu avô foi uma presença muito importante na minha vida, não só como figura pública, mas ele foi um super avô”.

Cacá Diegues, cineasta

“O Nelson inventou a maneira de fazer cinema no Brasil. O cinema moderno brasileiro foi inventado por ele. Ele foi o primeiro a filmar a favela como tema nobre, foi o primeiro a fazer cenas na rua como a gente precisava conhecer. Ele inventou um cinema para o país e o país coube dentro do cinema dele”.

 
POR: Rita Moraes
Publicado em 22/04/2018