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Mais factóides, naturalmente inúteis. Artigo do jornalista Alex Ferraz.

Nos idos de 2004 (como o tempo voa, hein? 2004 já são “idos”), trabalhei como redator numa campanha eleitoral em cidade próxima a Salvador.
 
O candidato estava praticamente empatado com a oposição, depois de ter levado longa e ampla vantagem nas pesquisas, e sua equipe de marketing entrou em pânico.
 
Assim, faltando cerca de 30 dias apenas para a votação, o chefe do marketing irrompe na redação e solicita a um dos componentes do núcleo “um plano de governo urgente”.
 
O redator, rapaz jovem mas muito competente, arregaçou as mangas, plantou-se na frente do computador, e em pouco mais de três ou quatro horas, lá estava, encapado, colorido, cheio de gráficos e farto em croquis e outras imagens, um deslumbrante “plano de governo”.
 
Uma peça de ficção. Inexequível. Porém,  impressionante. Divulgação imediata na TV, no horário eleitoral, além, claro, da distribuição farta junto aos chamados “setores formadores de opinião.”
 
O candidato, porém, perdeu. Não por causa da ficção do plano, mas tragado pela avalanche de realidade traduzida em explícita cooptação de um terceiro candidato, fiel da balança que bandeou para a oposição, mediante gorda verba.
 
Politica clássica no Brasil, assim como em muitas outros países (aí, porém, cabe ressalva traduzida em uma das muitas geniais frases de Millôr Fernandes: “Existe corrupção em várias partes do mundo. A maioria delas no Brasil.”).
 
Corta para os dias de hoje.
 
Encurralado pela absoluta ineficácia de uma série de projetos e planos gerados em luxuosos gabinetes, sustentados em rebuscado palavreado e apresentados com aquela sisudez que insistem em nos fazer crer tratar-se de seriedade, autoridades continuam a criar factóides com a pressa típica de véspera de eleição.
Um exemplo, agora, é o tal Sistema Nacional de Segurança (gerando a infeliz sigla SUS, ligando imediatamente ao torturante SUS médico). Querem nos fazer crer que um pomposo projeto, elaborado “nas coxas”, para usar a exata expressão popular, reunindo as mesmas cabeças e vícios que ao longo de décadas resultaram em nada (aliás, a situação só fez piorar) vai revolucionar a segurança pública no país.
 
Basta lembramos a enorme quantidade de siglas e planos nacionais disto e daquilo que hoje hibernam em gavetas mofadas de móveis que provavelmente já foram para algum depósito ou para o lixo.
Foram ficções eleitoreiras criadas por governos de diversas cores.
Ah, seria tão bom se canetadas e planos mirabolantes pudessem reverter da noite para o dia a tenebrosa situação brasileira! Refiro-me ao Brasil da maioria, sempre pobre e mal remunerada, quando remuneração tem.
Não, senhores. É preciso muitíssimo mais que factóides para nos levar a ter nossa auto-estima de volta.
Vai dar muito trabalho e exigir muita sinceridade de objetivos desmontar o caos social gerado por décadas (ou séculos) de absoluta indiferença com a falta de civilidade. É  a realidade. Simples assim…
 
Artigo do jornalista Alex Ferraz.
POR: Rita Moraes
Publicado em 21/05/2018